Jauru: “Viemos para te matar”, revelou padre ao amigo, minutos antes de morrer – vídeo

Forças ocultas da política local planejaram o martírio e encomendaram a morte do padre Nazareno Lanciotti, dia 11 de fevereiro de 2001 em Jauru (a 450 km de Cuiabá). É no que acredita o monsenhor, padre e fundador da Coopenoroeste Celso Duca, um dos melhores amigos do pároco assassinado com tiro na nuca.  Para Duca, não restam dúvidas, foi um atentado. “Encobriram para que ninguém soubesse quem foi que mandou (matar). Mas nós sabemos quem foi! Só não queremos nenhum processo. Deus se encarregou de resolver o problema, pois cada um vai receber o que deve, não acreditamos na Justiça dos homens”.

Com 91 anos, ele falou com exclusividade ao  sobre a morte do companheiro de sacerdócio.

Duca mora em Araputanga (a 258 km da Capital). Recebeu a reportagem na casa paroquial e relatou como recebeu a notícia fúnebre. “Eram dez horas da noite, quando me ligaram. Nazareno foi levado no avião de um dos donos do Hospital de Câncer de Barretos, Henrique Prata, até Cuiabá e de lá seguiu para São Paulo”, detalha.

Para o avião levantar voo em Jauru, Henrique Prata teve que brigar com plantonistas do aeroporto Marechal Rondon que não estavam liberando a decolagem. Afirmou que pagaria multa, mas que seguiria mesmo assim. Ao longo do voo para a Capital, o padre, que foi acompanhado pelo médico Laerte Petrônio de Figueiredo, sofreu três paradas cardíacas controladas.

Quando o avião posou em Várzea Grande, uma UTI móvel já estava a espera dele e do monsenhor Celso Duca. O destino era o Hospital Sírio Libanês, um dos melhores do país. “Ele estava lúcido. Entendia tudo e falava um pouquinho. (Em estado grave), se confessou e ofereceu sua vida para a Igreja e perdoou de coração a quem a retirou. O atentado foi feito em ódio ao trabalho religioso dele”, lamenta Duca.

No voo, Nazereno fez uma revelação. Confidenciou ao amigo que, antes de atirar, o assassino disse: “Viemos aqui para te matar, porque você está atrapalhando o nosso trabalho”.

Esta versão soma ainda mais um detalhe sinistro. O assassino também teria sido executado, para que não entregasse ninguém e nem o mandante.

Duca afirma que os reais mandantes e executores nunca foram presos.

Veja vídeo

Primeiras apurações

Enquanto a população de Jauru sofria esperando notícias sobre o estado de saúde do Servo de Deus, as investigações foram iniciadas pela Polícia Civil. Um dos mais questionados pelos delegados do caso foi o vereador João Leite. Isso porque estava na rua no horário do crime, mas, conforme declarou, não conseguiu ver os bandidos fugirem.

“Eu ouvi o tiro e saí na rua, mas a minha esposa e filha me pediram para voltar para dentro de casa. Quando ouvi os sinos tocarem, elas não conseguiram me segurar e corri para o hospital. Me lembro do Dr. Laerte gritando: fecha a porta, se não vão voltar para terminar de matá-lo”, detalha. O vereador conta que no dia seguinte a polícia começou as investigações. Os delegados queriam entender o porquê dele estar na rua. Mas nada conseguiram provar contra ele. “Na época minha esposa era ministra e acabou se afastando dos trabalhos por conta disso,” lamenta.

Ao longo das investigações nenhum assassino foi apresentado aos moradores e as especulações começaram.

Luto

A notícia da morte chegou 11 dias depois, na noite de 22 de fevereiro. A população entrou em luto. De maneira automática o braço direito de Nazareno, Jorge Moreira, começou a cuidar dos preparativos para o velório. “Ele sempre brigou comigo para que eu tivesse liderança e neste momento entendi o motivo. Foi muito difícil”, conta.

O condenado

O comerciante Antônio Martins da Silva, 45 anos, foi condenado a 23 anos de cadeia por tentativa de latrocínio seguido de morte. Recebeu a sentença dia 15 setembro de 2006, ou seja, mais de cinco anos depois do crime. No entanto, isso é uma novidade para a população jauruense. A reportagem apurou que, aparentemente, ninguém sabe sobre este condenado, inclusive as demais vítimas do suposto assalto ou atentado,  Jorge Moreira, Simone Coelho Filho, Alair Davi e Franca Pini.

O comerciante se diz inocente e afirma veementemente que não estava em Mato Grosso no período do crime.

Mas quem é Antônio Martins da Silva? E por que invadiu um jantar em uma igreja e atirou em um padre durante uma roleta russa? Segundo o inquérito da Polícia Civil, ele integrava uma quadrilha que organizava assaltos em igrejas pelo Brasil. Entretanto o único assalto confirmado ocorreu em Barra do Garças em 19 de setembro de 2004.

Ao ser preso, Antonio era morador do bairro Jardim Imperial em Várzea Grande. Atualmente está preso na Penitenciária Central do Estado (PCE). É soropositivo.

A reportagem do  esteve em Jauru para conhecer bem de perto as testemunhas e vítimas deste crime marcante.  Todas desconhecem e não foram chamadas a fazerem reconhecimento do condenado. No processo, Antônio destacou que somente uma vez foi questionado sobre o crime e afirmou inocência. Entretanto a arma do crime foi encontrada com o cunhado dele, Claudio Cavalcanti Freire.

Segundo o relatório da Polícia Civil, Claudio e o sobrinho dele, Francinaldo Martins da Silva, teriam vendido a arma para um amigo, que não teve o nome divulgado. Na transação, acabou sendo apreendida por uma autoridade policial.

Depoimentos de comparsas dele, como consta no processo, comprovaram que ele praticava crimes dessa categoria em casas paroquiais. Mas somente neste crime ele teria participado da morte de um padre.

O segundo suspeito do crime em Jauru, no entanto, nunca foi localizado e nem sequer é mencionado ao longo do processo que tem cinco volumes.

O depoimento que liga Antônio à morte de Lanciotti é de Anselmo Brant. Ele procurou, voluntariamente, a polícia para contar que um dia após a morte do padre, no dia 23 de fevereiro, uma mulher, cujo o nome não consta no inquérito, o procurou relatando preocupação. Ela havia trabalhado em uma residência onde moravam quatro homens que teriam assaltado casas paroquiais e ela temia que fossem os mesmos que atingiram o padre Nazareno.

 analisou o processo que condenou Antônio e em seu depoimento ele ressalta que foi ouvido somente uma vez sobre o caso e nega qualquer participação. Destaca que estava viajando no período do atentando. Até hoje, nunca ficou claro quem foi que atirou no padre e nem quem era o comparsa da “frustrada tentativa de latrocínio”.

Anselmo Brant e Antônio nunca foram colocados frente a frente. Isso também nunca ocorreu com as oitos pessoas que estavam jantando com o padre no dia 11 daquele ano. 

O prefeito

O prefeito de Jauru, Pedro Ferreira, não acredita que o crime tenha sido político.  Ele relembra como recebeu a notícia do atentado. “Sei que eles estavam jantando e o cara começou a fazer roleta russa na cabeça de todo mundo. Eu não sei se ele tinha intenção de matar ou se perdeu a conta da bala. O pessoal diz que o cara veio para assassinar. Mas eu acredito que quando vem para matar não faz um tiro só”, opina.  A população de Jauru pensa de maneira diferente.

Premunição

A ministra Maura Ferraz contou à reportagem que, uma semana antes do crime, o padre confidenciou que algo estava para acontecer.

“Estávamos visitando doentes que moram um pouco a frente da minha casa e, quando estava próximo da minha casa, ele parou e me perguntou o que eu achava do novo milênio. Eu falei: ah padre, acho que está normal. Não consegui ver nada de diferente ainda não. Aí ele me disse: respondeu certo, está tudo igual. Mas daqui a uns dias vocês terão um sofrimento tão grande que vai ser muito difícil para vocês”.

Neste momento, ela se lembra que, quando olhou para o padre Nazareno, ele estava tão vermelho que parecia até transformado, não parecia a pessoa que ele era. Perguntei o que estava acontecendo, o que de tão grave ia acontecer? Comecei a fazer perguntas. Ele baixou a cabeça no volante, ficou nessa posição por alguns minutos, levantou, fez um sinal de cruz na minha testa e pediu para eu não contar nada para ninguém. Nem para o marido, espere o momento certo”, pediu.

O corpo

Após o recebimento da notícia da morte, um avião foi fretado em São Paulo, o corpo desceu em Cuiabá. Teve uma missa de corpo presente na Catedral realizada por Dom Bonifácio, então arcebispo. Em seguida ele seguiu para Cáceres onde uma segunda missa foi celebrada, mas dessa vez pelo Bispo Dom José Vieira, na sequencia ele foi levado para Jauru onde o padre foi velado na quadra da Paróquia Nossa Senhora do Pilar.

O clima foi de consternação. Pelo menos 12 mil habitantes participaram do velório. Todo o comércio estava fechado e o prefeito na época, Divino Marciano, decretou luto oficial de três dias. No calor do fato, várias hipóteses foram levantadas. Mas a população acredita em crime político até hoje e não em assalto. No entanto, ninguém cita nomes e evita especulações, por medo.

fonte: rdnews

Veja também

Em Sapezal Polícia Militar prende duas mulheres com mais de 900 porções de drogas

Suspeitas afirmaram que realizam o tráfico de drogas a mando de uma facção criminosa. Policiais …

Carreta tomba na BR-364

Nesta quarta-feira dia 20 por volta das 6:30 da manhã houve um grave acidente envolvendo …

Em Comodoro Polícia Civil apreende nove armas de fogo e munições durante investigação sobre duplo homicídio

As armas têm calibres de 22, 32, 38, como espingardas e revólver, e pistolas 357 …

Em Sapezal Polícia Civil prende envolvido em homicídio e ocultação de cadáver de jovem

Com a prisão do suspeito foi possível localizar o corpo da vítima que estava desaparecida …

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *